Desatinos em Tinos: amor (e sabor) à primeira vista

Como já dissemos, existe vida além de Mykonos e Santorini. Mais pitoresca, mais raiz, mais simples, mais barata, mais fascinante para os amantes da cultura grega. A Grécia sempre surpreende mesmo quando você não espera por nada. E foi assim na Ilha de Tinos.

Era mais uma noite sem fim em Mykonos. Após o jantar em Chora (nome que se dá ao centro comercial de toda ilha), começamos o nosso ritual que segue o mesmo desde que ali pisamos pela primeira vez juntos em 2014: a “via sacra” por bares, clubes e pistas para dançar. Gays e heteros se unem e se dividem em movimentos paralelos e convergentes porque a cena noturna é toda junta e misturada no mesmo distrito. Definitivamente para a comunidade mais adulta LGBTQIA+ a noite começa no chic e burlesco Lola Bar. E foi ali que soubemos de Tinos pela primeira vez.

Entre uma dose e outra de ouzo, conversando com o dono do Lola, Dimitris Georgiou, sempre amável conosco e apaixonado por música brasileira, ele nos convenceu: “vocês precisam conhecer Tinos”. Dimitris saiu para fazer algo no bar mas rapidamente voltou com um pedaço de papel com algumas recomendações anotadas. Era o começo de uma viagem inesperada e arrebatadora a poucas milhas de Mykonos.

Tinos é a terceira maior ilha das Cíclades, atrás de Andros e Naxos, situada a noroeste de Mykonos, com cerca de 10 mil habitantes. Uma ilha cuja economia é baseada no turismo de verão e no turismo religioso que atrai inúmeros católicos para o seu principal templo, o da Virgem Maria.
Os moradores da ilha vivem basicamente da agricultura, da criação de animais, do transporte, da pesca e do turismo. Você chega até ela por conexão entre os portos, no nosso caso, o novo porto de Mykonos, um trajeto de ferry (barco) que leva quarenta minutos. Você pode incluir na passagem o seu carro ou quadriciclo, caso tenha alugado. Em se tratando de Tinos, o carro fez toda a diferença para os passeios que fizemos.

Graças ao amigo Dimitris, estávamos de fato intrigados e excitados para desbravar por algumas horas essa Ilha que nos deixa com saudade até hoje (todas deixam, mas essa tinha algo a mais). São paisagens únicas da junção do encontro do mar com montanhas, onde a água parece ainda mais cristalina. Fazia um dia quente e os turistas se concentravam na cidade próxima ao porto, que também se chama Tinos (ou Chora). Os demais vilarejos estavam mais tranquilos, o que foi perfeito para curtir cada momento.

As estradas gregas são sempre estreitas e você tem uma experiência única que é o contraste da cor cobre das montanhas por conta do brilho do sol com o azul do mar e do céu reluzente. Pelo caminho ao dirigir, você cruza com cabras, ovelhas e dezenas de casinhas estilizadas que são feitas para as pombas da ilha. Sim, são muitos pombais. Algo inédito para nós, mais de 600 pombais existem na ilha em função dos venezianos que ali criaram e exportaram pombas no período de 1207-1715. Pomba tipo exportação!

Começamos o passeio pelo vilarejo de Volax ou Volakas, um diminuto complexo de ruas estreitas e labirínticas, com poemas gregos escritos em quase todas as portas e janelas. Situado numa região cheia de rochas esféricas, a paisagem lhe confere uma aparência lunar. Segundo a mitologia, as rochas são o que restou da batalha entre Gigantes e Titãs.

Volax é a aldeia das cestarias e do artesanato e também de muitos gatos! São tantos felinos que você se questiona qual a razão. A comida local são os “fourtalies”, embutidos que não tivemos o prazer de provar. Aproveitamos para comprar um orégano bem diferente e de excelente qualidade, figos da estação, tomates secos ao sol e mel.

De Volax partimos para Kolimbithra, uma praia linda, cristalina, quase deserta, onde fizemos um breve picnic. Tínhamos no nosso radar visitar uma vinícola de vinhos naturais, a Domaine de Kalathas, mas dessa vez não rolou. Estavam fechados para visita pois era o período da vindima. Então de Kolimbithra fomos para o porto mais romântico e de cena de filme que já vimos, Panormos.

Em Panormos há uma pequena praia bem charmosa, mas o que salta aos olhos é um pequenino cais saído de um filme de época na Grécia, com restaurantes um melhor do que o outro. A arquitetura é simples, casas brancas pequenas de pescadores e uma comida com ótimo custo-benefício. Escolhemos a Taverna Marina.

 
 

Cremos que foi lá que provamos a melhor comida da Grécia, o nosso “basiquinho” de sempre: polvo e camarões grelhados, acompanhados dessa vez de lula empanada, e vinho local na jarra. As lulas estavam crocantes e macias, pouca farinha ao redor, o empanamento perfeito. A gente saboreava a comida diante de uma paisagem natural de tirar o fôlego: montanhas semi-áridas, água límpida e cristalina, sol escaldante e a paz da Grécia.

Saindo do porto, partimos para Pyrgos, um vilarejo entre as montanhas que também recebe o nome de Panormos. Outra pequena vila povoada por gatinhos e formada por casas feitas de mármore que reluzem ao longe e igrejas com cúpulas, ora azuis, ora vermelhas. Seu pequeno centro comercial possui lojas de artesanatos, joias e meles locais. Por lá adquirimos mel e própolis de sabores únicos

Na praça central de chão de mármore, bem pequena por sinal, tomamos um café grego com o delicioso e famoso doce típico: o galaktoboureko, um doce cremoso como pudim porém folhado e servido com calda açucarada. Você aprecia tudo isso na maior paz sob uma árvore frondosa cinematográfica no Café Central.

Já eram mais de cinco horas no relógio, hora de tomar o caminho de volta ao centro de Tinos, que ainda não havíamos conhecido, e definir onde íamos assistir ao nosso último pôr do sol na Grécia. Era uma segunda-feira, talvez a mais inesquecível de todas as segundas-feiras que já vivemos juntos.
Iniciando o retorno e em busca do sol, paramos próximo ao sítio arqueológico do Templo de Poseidon, o deus do mar, onde quase nada existe ali de remanescente. Essa parte da estrada forma um grande passeio para caminhadas com lindas vistas para o pôr do sol. Ali paramos, ficamos e nos emocionamos. Tomamos um restinho de ouzo e lançamos nossos pedidos ao mar (e aos deuses).
De volta ao centro e próximo do porto, hora da partida, conseguimos desbravar a pitoresca cidade em alguns minutos, com tempo para escrever cartões postais, tomar mais um café e saborear o último galaktoboureko da viagem, no Mesklies, uma cafeteria elegante bem frequentada por senhores e senhoras muito charmosos.

Dimitris tinha razão. Saímos de Tinos apaixonados. Com a certeza de que vamos voltar.

 
 
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Paros: a Nova Mykonos (ou o que ela foi um dia).